Graças a Deus, não fui uma autista sem amigos. Eu e a minha melhor amiga, ficamos próximas na educação física. Porque, eu era sempre a última a ser escolhida e ela a penúltima. Até hoje ela se acha por isso, mas tudo bem. Mesmo tendo poucas e boas amigas, passei por coisas que ninguém sabe.
Eu percebia a zoação na escola pelo meu jeito esquisito. Não foi nada tão
hediondo sabe. Mas junta uma coisinha aqui, outra ali, e a gente até esquece o
que é autoestima. O problema, é que eu tenho essa super audição pra ajudar.
Além de ouvir mais alto, ainda sou capaz de prestar atenção em muitos sons ao
mesmo tempo. Então eu ouvia aqueles comentários desnecessários na aula, na
rua, no ônibus. Na maioria das vezes, era porque eu sempre tive um jeitinho
muito meu de me vestir.
O Hiperfoco na Moda e Minha Audição Inconveniente
Primeiro, eu gostava de vestir tudo monocromático. Aí me chamavam de tudo
quanto é fruta que se pode imaginar. Também tive hiperfoco com estampas.
Teve uma época que tudo tinha que ser do Piu Piu. Depois era tudo de
zebra, ou de oncinha. E minha mãe contribuía, ela me deu até guarda-chuva
de onça. Não estou reclamando não, eu amava aquele guarda-chuva! Também
teve a fase das borboletas no cabelo, aí me chamavam de jardim. Mas eu
achava que era elogio, porque jardim é bonito né. Então, eu colocava mais
borboletas ainda. Olha, até que mesmo sendo zoada eu fui persistente em
manter meu estilo. O hiperfoco era maior que a vergonha. Em parte, foi
culpa da minha mente divergente, que não entendia algumas piadas que
faziam comigo.
Conforme fui ficando mais depressiva, comecei a vestir tudo preto. Como
não gostava de olhar nos olhos, já tacava o cabelo na cara, bem estilo
Samara. Aí eu ouvia o povo me chamando de fantasma. Mas nesse caso eu não
me importava, porque a intenção era essa mesma né. Queria que passassem
bem longe de mim.
Coitado do Meu Processamento Sensorial
Pena que deixei a gótica pra tentar parecer ter a idade que eu tinha.
Algumas colegas me zoavam por não ter muito corpo, e lá vai eu querer
provar que era bonita. Colocava umas roupas justas que acabavam com o
meu sensorial. Eu usava sutiãs com aro e bojo, e ainda apertava ao
máximo. Só pra ter um decote razoável e calar a boca das inimigas.
Gente, eu passava a aula toda louca pra ir pra casa tirar aquilo. Nem
conseguia prestar atenção na matéria direito.
Outra coisa, é que sempre tive alergia a brincos e usava mesmo assim,
com orelha sangrando e tudo. Não é exagero, o furo de uma orelha até
fechou agora que parei de usar, porque vivia em carne viva. Como eu
judiei de mim nessa vida.
Outro motivo de zoação era o cabelo. Primeiro, eu não entendia que meu
cabelo era cacheado, e quando penteava ficava um volumão. Aí por causa
do bullying, eu comecei a deixar sempre preso. Só que fazia um penteado
lambido, pra piorar a situação. Repuxava tanto que dava dor de cabeça.
Eu chegava a arrancar os fiozinhos arrepiados com uma pinça. Até o dia
que descobri o bendito creme pra pentear. Isso foi na época da Samara.
Eu era fã do filme "O Chamado" mesmo, não estou me xingando. Mas até a
Samara soltar a cabeleira e sair poço, foi uma sofrência. Ficava horas
me arrumando pra aula, e chorava bastante por causa do cabelo.
Cadê o Tal do Acostuma?
Quando eu era pequena, nunca aceitei que minha mãe me colocasse uma
calça jeans. Aprendi a andar fugindo de uma. Mas quando cresci, eu
mesma me torturava. Não sabia que meu sensorial era diferente, então
achava que uma hora eu iria acostumar com aquela sensação horrível.
Mas essa hora não chegava nunca. Me iludiram e tô esperando até hoje o
tal do acostuma.
Não sabia do meu autismo, muito menos do transtorno de processamento
sensorial. Até porque, minha mãe me levou na pediatra, pra entender
porque eu era uma criança nudista. Mas a mulher disse que era coisa
minha mesmo. Claro que era coisa minha, ia ser de quem? Nem falo nada
dessa moça querida, tô só aguentando aqui.
Então né, eu pensava que era uma fresca, que não aguentava andar
vestida como as outras meninas. Não entendia como elas aguentavam
aquilo tudo tão bem. Sutiã, brincos, absorvente, calça jeans... Tudo
ferramenta de tortura pra mim. Já em casa, eu sempre fui meio mendiga.
Meu maior medo de ter um namorado, era ter que andar arrumada dentro
de casa. Olha, graças a Deus arrumei um marido que me acha mais bonita
desarrumada que arrumada. Vai entender. No fim, as inimigas só me
fizeram sofrer à-toa.
Apesar do sensorial eu sou vaidosa, isso é meio triste. Gosto muito de
me arrumar, só que sofro um bocado. É questão de pôr na balança. A
verdade é que nunca fico confortável, só existe aquilo que incomoda
menos. Se eu ficar sem roupa, até a pele encostando na pele vai
incomodar. Agora depois de velha que fui me conhecer. Então, estou
redescobrindo meu verdadeiro estilo. Acho que dá pra encontrar um
equilíbrio entre o fofo e o confortável. Eu só não abro mão das
estampas de bichinhos e desenhos.
Se amem do jeitinho que são.
Bom, essa foi a história neurodiversa da minha adolescência. Um artigo
bem diferente dos de costume. Ia falar algo profundo no final sobre se
amar, respeitar o corpo e tal, mas vocês são inteligentes e já
captaram a mensagem.
Não estou muito poética hoje. Minha parte culta saiu de férias e eu
não sei quando volta. Estou testando um remédio novo para o TDAH, o
Atentah. Tomara que dê bom. Eu comecei a meditar melhor e tomar banho
mais rápido, sem me perder tanto na Disney. Depois vou contar as
mudanças que percebi.
Mesmo em adaptação ao medicamento, eu quis vir aqui falar do meu
autismo. Vim só pra calar a boca dos incomodados. (Como eu mandei calar
a boca nesse texto.) Estou meio esculhambada, porque andei atraindo uns
capacitistas por aí na internet. Ainda estou limpando as sombras da
época do Bullying, então acontece. Mas estou aqui para mostrar, que não
vou desistir de me expressar. Meu chakra laríngeo desbloqueou e está
lindão. Só aceitem! Vou fazer que nem quando falavam das borboletas, e
eu entendia como elogio. Falarei ainda mais!
Esse é meu jeitinho de tentar positivar minhas dores, contando coisas
tristes com o meu toque de Camilla hiperativa. Apesar de ser um assunto
muito sério, eu só consigo desabafar assim. Porque se não, vai doer
muito. Mas preciso pôr pra fora, já que isso ressurgiu. A Centelha tá
pedindo pra eu mostrar a minha parte humana também. Então, aí está a
verdade! Eu fico braba com os haters sim! Me dá vontade de mandar bem
longe. As vezes esqueço que somos um, e bagunço as energias mesmo. Mas
bora limpar tudo de novo, que aqui a gente é persistente no Hiperfoco.
...
*Voltei aqui no artigo para fazer uma observação, porque cada dia que
passa eu sou uma nova Camilla, com novos pontos de vista. Por
coincidência, houve o caso de morte de um autista devido ao bullying
na escola. Nessas horas, a gente pensa tanta coisa, surgem vários
gatilhos.
Cheguei até a minimizar o que passei. Pensei: Ah, mas que bom que não
entendia tudo. Ah, mas pelo menos não apanhei...
É por isso que nunca devemos comparar as experiências humanas, não há
comparação. Mas só sei que uma criança autista foi pro céu e agora parou
de sofrer. Enquanto isso, milhares estão morrendo em pedacinhos lentos
que são retirados de seus corações. Algumas conseguem se tornar adultas,
outras cansam antes. A violência verbal, é tão abominável quanto a
violência física. Não há comparação, nenhuma é leve.
Eu contei a minha história aqui de uma forma muito mais "leve", do que
realmente é o peso desse iceberg. A verdade, é que eu mal mostrei a
pontinha. Mas isso não tira todo o peso que ela tem, e que eu ainda
estou tirando das minhas costas. Algumas pessoas podem achar apenas uma
história simples com alguns incidentes depreciativos. Só que uma pessoa
se desenvolveu durante essa história aí. Uma mente, aprendeu as coisas
da forma errada. Uma menina cresceu se sentindo inferior, imperfeita,
inconveniente, incapaz. É isso que uma "piadinha" aqui e outra ali pode
fazer.
Não apenas isso, pois somos criadores! Essa mente criou um mundo
particular que provava tudo isso pra ela. Essa pessoa, viveu momentos de
profunda depressão, que nenhuma criança ou adolescente deveria sentir.
De grão em grão, de crítica em crítica, a nossa bagagem vai pesando, até
o ponto de nos fazer parar. Eu parei, e tô até agora esvaziando essa
mochila, chamada de "Autismo Levinho".
Como Deuzinhos que somos, vocês acham que a consequência de quem comete
bullying é só no outro? Não é não! Somos um! Sinto dizer, que a vida
devolve aquilo que plantamos. E se não devolver aqui nessa vida ainda,
quando a pessoa voltar ao Todo, ela sente cada dorzinha que causou.
Como quem já teve Hiperfoco em EQMs por um ano, aconselho tomar cuidado
e plantar só amor!
Apenas com palavras, não é possível mostrar toda profundidade do que eu
passei e senti nessa vida. Agora o que eu posso fazer é honrar a minha
história. Transformando cada pedrinha da minha bagagem, em empatia e
amor.
Se você está passando por Bullying ou invalidação nesse momento,
saiba que eu gostaria de te dar um abraço, e dizer que você já venceu.
Não é você que é errado, inadequado, incapaz ou imperfeito. São as
pessoas que estão jogando essas coisas em você! Isso só diz respeito a
elas, não deixe ficar no seu coração. Incapaz, imperfeito e
inadequado, é quem não sabe amar. Deus escolheu vir pra esse mundo
vivendo na experiência humana de ser você! Porque ele te acha
perfeito! Ele te ama do jeitinho que você é! Eu entendo você, eu te
aceito, eu te respeito. Eu te amo e sou grata pela sua existência.
Seja o amor que você nasceu pra ser. Continue vivendo do seu jeitinho
único, pois é pra isso que Deus te fez. Deixa os outros lá, tentando
se colocar em padrões robotizados e jogando as experiências deles ao
vento. Viva a verdade que eles não estão vivendo!
E só mais uma coisinha aqui... Ninguém vai me fazer duvidar do meu
diagnóstico de Autista. Porque antes mesmo da especialista me confirmar
isso, eu recebi essa notícia de Deus! A resposta veio, após eu suplicar
para entender todo sofrimento que enfrentei durante 35 anos. E com um
diagnóstico errado de Fobia Social aos 20 anos, que apenas serviu para
me apresentar aos antidepressivos. Agora que eu tenho Deus, não preciso
de elogio de ninguém para continuar escrevendo. Eu sei que a minha
experiência é valiosa assim como todas são. A minha experiência não
invalida a de nenhum outro Autista. Pelo contrário, se alguns não podem
falar, eu estou aqui para fazer a minha parte. Quer gostem, ou não.
Ninguém vai conseguir me apagar mais. Eu sei quem Eu Sou aqui na
experiência e fora dela também. Eu sei a minha natureza.
Também queria dizer, que eu não sou perfeita. E se um dia eu contribuí
para colocar uma pedrinha na mochila de alguém, mesmo que eu não lembre,
mesmo que sem querer, eu sinto muito do fundo do meu coração. Pois eu
sei, como todas essas pedrinhas juntas, podem pesar na vida de alguém.
Saiba, que ninguém que faz algo assim está sendo quem é, nem quem veio
ser. Um dia todo mundo descobre isso, cada um tem o seu tempo. Hoje eu
sei quem eu sou, mas na ilusão da separação, a gente se perde da
verdade. Acontece com todos, e o importante é perceber o que não somos.
É só isso que a sombra quer mostrar. Vamos abrir os olhos para perceber.
Tem algo que ainda precisa melhorar. A gente consegue, Deus acredita em
nós!
*Eu acho que mais um Burnout está passando... Pois é, conseguiram me
dar uma leve apagadinha temporária, mas foi só pra eu voltar com mais
força ainda. Olhem só o tamanho que ficou a observação! 😅
Fiquem com a despedida da Camilla Burnout, que estava meio sem
sentimentos e tentando voltar pra superfície de forma
otimista.
...
Vou deixar a minha foto preferida da vida, pra mostrar o estilo da
blogueira fashion que já fui! Eu já era adulta aí, não era adolescente
não. Continuo com os mesmos gostos peculiares, e ai de quem reclamar!
Um beijo da Camilla dos corações no coração de vocês!
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