Música alta pode gerar karma. Relato Autista

Música alta pode gerar karma. Relato Autista

Cada som fora de mim, até os mais distantes são captados pelos meus ouvidos. Agora mesmo, enquanto tento me concentrar para escrever esse artigo, ao mesmo tempo presto atenção no som da música da vizinha de dois andares acima. O som desce pelas paredes como uma vibração repetitiva, as vozes soam como um cochicho chato, já que não dá para entender a letra da música. Também tem um rádio ou televisão de mais alguém. Escuto o som das pessoas jogando vôlei na quadra, o barulho da bola sendo sacada, o som da bola batendo na rede metálica e até os suspiros dos jogadores. Ouço as motos e carros passando na avenida a algumas quadras daqui, e também alguém serrando metal. Também tem o barulho da eletricidade do meu notebook, o som do zumbido no meu ouvido e o som das teclas do teclado.

Sons que todo mundo escuta, para mim podem ser perturbadores, pois meu sensorial foca em todos ao mesmo tempo. Graças a um remédio abençoado, já não os escuto mais tão altos e irritantes, e também não sinto mais aquela cosquinha invasiva do som entrando no meu ouvido. Sabe, existem muitas pessoas por aí como eu. Tem as que não sabem que tem Autismo, e outras que nem conseguem contar como se sentem, pois não falam ou são crianças.

Eu não consigo me adaptar muito bem com abafadores de nenhum tipo. Primeiro, porque o meu sensorial é super delicado até para as sensações físicas. Eu uso fones de ouvido quando preciso, mas eles incomodam tanto quanto os meus óculos. Pra ter uma ideia, eu durmo com camisetas bem grandes do meu marido, que precisam ser de um tecido liso e macio. As vezes ainda coloco do avesso para não sentir a costura. Quando tem estampa não dá para usar do avesso, porque a sensação da estampa na pele é pior.

Segundo, tem o zumbido do meu ouvido, que eu já aceitei e entreguei pra Deus. As vezes ele até se sobressaí aos outros sons.

Terceiro, tenta colocar tampão no ouvido e comer alguma coisa pra ver que agradável. Ao usar tampão eu aceito que vou ter que ouvir meu coração batendo, meu zumbido, minhas passadas no chão e todos sons internos do meu corpo. Eu uso pra dormir, é como fazer uma escolha sobre o que eu suporto melhor. Faço de conta que meu zumbido é um ruído branco, aceito meus barulhos internos e escolho ser grata por estar em um corpo com órgãos funcionando. Mas ainda tem aquela sensação estranha, que parece um dedo enfiado no ouvido.

Enfim, sinto tudo ao mesmo tempo e de forma mais intensa que os neurotípicos. Antigamente eu pensava só que era uma fresca que não aguentava o que todo mundo suporta. Voltando a falar sobre os sons... A quantas quadras da avenida o som da caixa de música de uma carro pode ser captado? Quantos autistas como eu são atordoados por pessoas ditas "felizes e de bem com a vida"?

Esses dias no supermercado, ouvi um senhor comentando que ele era uma pessoa muito positiva e alegre, e que adorava escutar música a todo volume. Que as pessoas reclamam dele e ele não está nem aí, pois é feliz. A vizinha aqui do bloco, também fala a mesma coisa no grupo do condomínio. Quando algum morador reclama, ela diz: "vão ser felizes!" Fico até com um pouco de pena, pois eu acho que ela também é autista, por tamanha falta de noção de comportamento (falando sério, não é zoeira não). Mas com certeza ela não é uma autista com transtorno de processamento sensorial, como eu e muitos por aí. Olha só eu fazendo fofoca dos vizinhos no meu blog de espiritualidade, que errado isso.

Me pergunto, quantas pessoas fazem o mal sem nem se dar conta disso. Ou será que não estar nem aí, já é considerado saber que está errado? Imagina só, se o karma pelo sofrimento de autistas e neurotípicos, atingidos pelas músicas dessas pessoas "felizes", for considerado válido. Que tipo de energia positiva, uma pessoa que perturba conscientemente, três quadras de moradores ou vários andares de um prédio, pode carregar?

Eu não queria fazer esse artigo muito longo, porque a intenção não é ser vitimista ou rabugenta (mas acabou ficando meio coisado mesmo, e tá tudo bem). Quero apenas alertar e fazer as pessoas refletirem sobre um assunto que não é muito comentado. Não me refiro a quem escuta música em um volume normal e em horário e local apropriado. Os Ubers por exemplo, alguns se quer perguntam se está ok ouvir rádio. E pra quê som alto em supermercados e lojas, não podia ser um sonzinho em um volume agradável?

Muitos autistas não podem se expressar e contar o que sentem, então eu vou fazer o que puder para ajudar. Fazer isso ressignifica meu sofrimento e transforma essas coisas chatas em algo útil. Não me importo se estou focando temporariamente na parte ruim, acho que no fim o alívio e utilidade compensam. Melhor do que brigar com os outros por aí. Escrevo sem ódio no coração (pelo menos eu acho), eu fico sim é um pouco triste, mas logo passa...

Que bom que os medicamentos estão me ajudando a abstrair todos esses sons intrusivos e me permitindo escrever agora. Tudo já esteve bem pior, mas eu sei que era porque meu corpo queria me mostrar que eu precisava de ajuda.

Dizem que quando não se sabe estar fazendo o mal nada de ruim acontece, mas agora que você leu isso, eu acho melhor começar a usar fones de ouvido. Eu sei, isso foi uma piada bem sombria. Mas sei lá, eu vou deixar a piada aqui e não vou excluir não. 😅



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